PRODUTOS DERIVADOS DE PITANGA (Eugenia uniflora L.) EM FLORIANÓPOLIS (SC): ANÁLISE COMERCIAL ASSOCIADA À ACEITABILIDADE DO SUCO TROPICAL DA FRUTA


PRODUCTS DERIVED FROM PITANGA (Eugenia uniflora L.) IN FLORIANÓPOLIS (SC): COMMERCIAL ANALYSIS ASSOCIATED WITH THE ACCEPTANCE OF FRUIT TROPICAL JUICE


Daniele FELLER1 Liz Cristina Camargo RIBAS2 Fabiana Mortimer AMARAL3


Recebido em:16/03/20 / Aceito em: 05/08/2020


Resumo


A biodiversidade apresenta papel importante na manutenção e construção de uma gastronomia identitária, estimulando cadeias produtivas locais que respeitam aspectos ecológicos da região. Considerando a biodiversidade autóctone do sul do Brasil, destaca-se a pitangueira (Eugenia uniflora L.), planta que produz frutos com grande versatilidade gastronômica, mas ainda subutilizada e pouco cultivada com propósito comercial nessa região. Dentro desse contexto, o presente trabalho objetivou analisar a presença, demanda e procedência da matéria-prima de produtos derivados de pitanga – polpa congelada, suco e sorvete – no comércio de Florianópolis (SC). Verificou-se ausência de comercialização da polpa industrializada nas principais redes de supermercados locais durante o período de avaliação, bem como a reduzida demanda do suco em casas especializadas do Centro de Florianópolis. Cerca de 28% das sorveterias avaliadas afirmaram comercializar sorvete da fruta, com demanda comprovada. Objetivando avaliar os motivos da rejeição do suco e a ausência da polpa nos mercados, realizou-se complementarmente teste de aceitabilidade do suco de pitanga elaborado a partir de sua polpa industrializada, comparando-o com o suco elaborado a partir da polpa extraída artesanalmente da fruta, bem como com o suco de polpa de acerola (padrão comparativo). Os resultados evidenciam que a baixa demanda pelo suco de pitanga pode estar relacionada às características organolépticas da polpa industrializada empregada.

Palavras-chave: Biodiversidade, frutas nativas, gastronomia, polpa de fruta, sorvete.


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1 Instituto Federal de Santa Catarina – (IFSC), Campus Florianópolis-Continente, Florianópolis – Santa Catarina –

Brasil. Tecnóloga em Gastronomia. E-mail: dani_feller@hotmail.com

2 Instituto Federal de Santa Catarina – (IFSC), Campus Florianópolis-Continente, Florianópolis – Santa Catarina – Brasil. Professora de Ensino Básico, Técnico e Tecnológico – Departamento de Ensino, Pesquisa e Extensão (DEPE). E-mail: lizribas@ifsc.edu.br

3 Instituto Federal de Santa Catarina – (IFSC), Campus Florianópolis-Continente, Florianópolis – Santa Catarina – Brasil. Professora de Ensino Básico, Técnico e Tecnológico – Departamento de Ensino, Pesquisa e Extensão (DEPE). E-mail: fabiana@ifsc.edu.br


Abstract


Biodiversity plays an important role on the maintenance and creation of a unique gastronomy, stimulating local production chains that respect the ecological aspects of the region. Considering the autochthonous biodiversity of southern Brazil, there is the plant known as pitangueira (Eugenia uniflora L.), which produces fruits with a huge gastronomic versatility, but not yet widely used or produced for commercial purposes in this region. Knowing that, the presented work focused on the analysis of the presence, demand and origin of raw materials of pitanga derivatives – frozen pulp, juice and ice cream – at Florianópolis (SC) market. There was an absence of commercialization of industrialized pulp in the main local supermarket chains during the evaluation period, as well as the reduced demand for juice in specialized houses in downtown Florianópolis. About 28% of the evaluated ice cream shop confirmed they sell pitanga ice cream with a comproved demand. In order to evaluate the reasons for the rejection of the juice and the absence of the pulp in the markets, an acceptability test of the pitanga’s juice elaborated from its industrialized pulp was carried out, comparing it with juice from homemade pulp from pitanga fruit, as well as with acerola’s pulp juice (standard reference). The results show that the low demand for pitanga juice may be related to organoleptic characteristics of the industrialized pulp used.

Keywords: Biodiversity, native fruits, gastronomy, fruit pulp, ice cream.


INTRODUÇÃO


O termo biodiversidade se refere à riqueza e à variedade do mundo biológico – tanto em nível genético e de espécies como de ecossistemas e paisagens, sendo o Brasil o país detentor da maior diversidade biológica global (Lewinsohn; Prado, 2005; Mittermeier et al., 1997). Por outro lado, a sociedade contemporânea segue uma dieta altamente simplificada e dependente de recursos genéticos externos (Coradin, 2011), desconhecendo e negligenciando diversas espécies de plantas (Kinupp; Lorenzi, 2014) que poderiam auxiliar na diversificação e na segurança alimentar e nutricional, dando suporte para a soberania alimentar e ampliação das formas de renda para pequenos produtores agroecológicos.

Além disso, conforme o Relatório Síntese da Avaliação Ecossistêmica do Milênio – considerada uma das mais amplas avaliações já realizadas sobre o estado e a saúde dos ecossistemas do planeta, "nos últimos 50 anos, o homem modificou os ecossistemas mais rápido e extensivamente que em qualquer intervalo de tempo equivalente na história da humanidade" (Reid, 2005), acarretando uma perda substancial da biodiversidade global.


Contrapondo-se a isso, a estabilidade da natureza tem estrita ligação com a diversidade, sendo que a agricultura rompe com esse equilíbrio por ser uma simplificação do ecossistema original. Assim, perde-se a capacidade de autorregulação natural, havendo a necessidade de uma permanente interferência do homem nesse processo (Assis, 2006). Por outro lado, a agricultura diversificada contribui para a manutenção da biodiversidade, diminuição de uso de agrotóxicos, além de estimular a persistência de organismos importantes como polinizadores, microbiota do solo e inimigos naturais. Segundo AGUIAR-MENEZES (2004), "nenhum outro aspecto dos sistemas agrícolas proporciona tantos serviços ecológicos fundamentais para assegurar a proteção de plantas contra pragas quanto a diversidade da vegetação". LEITE E CORADIN (2011) afirmam que esse cultivo variado dá novas opções para a agricultura familiar, favorece a ampliação das oportunidades de investimentos no desenvolvimento de novos produtos pela indústria e contribui para a redução da vulnerabilidade do sistema alimentar brasileiro.

De acordo com KINUPP e LORENZI (2014), muitas das plantas eliminadas com a implantação da monocultura, consideradas "daninhas" ou "invasoras", apenas por ocorrerem em lugares entre as plantas cultivadas ou em locais onde as pessoas acham que não devem ocorrer, são espécies com grande importância alimentícia. Ainda segundo os autores, uma das listagens das plantas comestíveis do mundo mais completa é a de KUNKEL (1984 apud Kinupp; Lorenzi, 2014), onde consta cerca de

12.500 espécies. Já para o Brasil, compêndio da literatura aponta cerca de 3 mil espécies com potencial alimentício no país. Entretanto, 90% do alimento mundial vêm de apenas 20 espécies, as mesmas descobertas no período neolítico.

Sendo assim, o uso de diferentes ingredientes autóctones do território na gastronomia – não apenas adquiridos por extrativismo, mas também por processos produtivos sustentáveis – corrobora para a manutenção da biodiversidade e identidade local, além de contribuir com novas opções para a agricultura familiar. Conforme CARLO PETRINI, fundador do movimento Slow Food:


A biodiversidade é a maior segurança da qual a humanidade dispõe. [...]. Em um momento histórico em que a cozinha e os grandes chefes vivem uma onda de grande atenção midiática e de público, o risco é de perder o contato com a origem da matéria-prima e com o trabalho de uma multidão de agricultores, famílias do campo e produtores artesanais que com o seu suor


de seu trabalho, fornecem a base necessária e insubstituível de qualquer prato. Como cidadão, devemos ser conscientes de que o peso do patrimônio gastronômico de um país está posto sobre as costas dessas pessoas, que são as mesmas a proteger o meio ambiente, mantendo vivas as comunidades marginais, salvando as terras da erosão e promovendo a proteção da diversidade biológica, cultural e alimentar (SLOW FOOD, 2017, p.1).


Dentro desse contexto está a pitangueira (Eugenia uniflora L.), pequena árvore nativa do Brasil, comum na região litorânea do sul do país. Conforme LORENZI et al. (2015), a espécie é uma planta frutífera com vasto cultivo em pomares domésticos de todo o país e comercialmente no Nordeste, além de ser abundante na natureza. Entretanto, segundo o Slow Food Brasil (2016), a fruta já esteve bastante presente nos quintais dos moradores locais, sendo que em função de mudanças de hábitos e por fornecer frutos delicados de difícil transporte, está cada vez mais se extinguindo da memória gustativa dos brasileiros.

Seu fruto apresenta coloração variando do amarelo ao vermelho e quase negro, caracterizado por um aroma intenso e sabor doce e ácido (Bourscheid et al., 2011). O próprio termo “pitanga”, de origem tupi, corresponde ao sentido daquilo que é "avermelhado", "pardo" ou "cor de cobre" (Villar; Houaiss, 2009). LIMA e colaboradores (2002) afirmam que a fruta é conhecida também no exterior como "Brazilian cherry", sendo encontrada em diversos países por se adaptar a diferentes condições climáticas.

Entretanto, deve-se atentar ao fato de que E. uniflora não é a única espécie conhecida pelo nome “pitangueira” no Brasil, apesar de muito abundante. Eugenia pitanga (O. Berg) Nied é outro exemplo de espécie com a mesma denominação popular (JBRJ, 2020), conhecida também por pitanga-do-cerrado (Lorenzi et al., 2015), mas que ocorre em mais de um domínio fitogeográfico brasileiro – Cerrado, Mata Atlântica e Pampa (IBRJ, 2020). Segundo BISHEIMER e colaboradores (2010), o gênero Eugenia, pertencente à família Myrtaceae, é muito amplo, possuindo cerca de mil espécies – todas originárias de regiões tropicais e subtropicais.

Em relação à área de ocorrência, pode-se dizer que E. uniflora não é uma espécie endêmica do Brasil, encontrando-se também no Paraguai, Argentina e Uruguai (Sobral et al., 2006). Em território nacional, ocorre nos biomas Cerrado, Mata Atlântica e Pampas – da Bahia ao Rio Grande do Sul (Sobral et al., 2015). Conforme


LORENZI et al. (2015), a pitangueira é “nativa das matas semidecíduas do planalto e da bacia do Paraná, desde Minas Gerais até o Rio Grande do Sul, bem como das restingas de toda a costa brasileira" (p. 426). BISHEIMER et al. (2010) afirmam que em Florianópolis (SC), na faixa litorânea com vegetação de restinga, existem locais com populações quase puras de pitangueiras.

O arbusto apresenta variação da época de floração e frutificação, dependendo das condições climáticas de onde está localizada. Conforme BOURSCHEID e colaboradores (2011), em geral frutifica de agosto a fevereiro, sendo que nas regiões Sul e Sudeste do país pode também frutificar de abril a julho. De acordo com o Projeto Flora Digital, com foco em espécies do RS e SC, a frutificação ocorre nesse território de outubro a novembro, bem como de março a abril (UFRGS, 2019).

Segundo BOURSCHEID et al. (2011), não se dispõe de dados oficiais, porém, estima-se que o Brasil seja o maior produtor mundial de pitanga, com os maiores plantios localizados no Estado de Pernambuco. Pelos frutos serem frágeis e perecíveis, o comércio da fruta fresca é dificultado. Mesmo assim, em cidades próximas aos centros produtores, pode-se encontrar a fruta sendo comercializada em alguns supermercados. Isso porque o fruto é popularmente apreciado in natura pelo seu sabor suave e adocicado, com polpa de consistência carnosa e suculenta.

Há potencial da fruta em produtos processados, como a própria polpa de pitanga congelada – já encontrada no comércio em nível nacional, o qual pode se intensificar com a valorização e popularização da espécie dentro das gastronomias regionais. Conforme BOURSCHEID et al. (2011), além da polpa, a fruta ainda pode ser consumida em forma de geleias, doces, sucos, licores e sorvetes.

Considerando ainda sua composição nutricional, a utilização da pitanga deveria ser estimulada devido principalmente à sua elevada concentração de vitamina A, auxiliando em campanhas de educação nutricional (Franzão; Melo, 2003). Segundo BOURSCHEID et al. (2011):

A presença de licopeno em sua composição é responsável pela coloração vermelha intensa da fruta, sendo também um poderoso antioxidante que tem se mostrado muito eficiente no combate a doenças degenerativas, tais como o câncer (p. 622).


Dessa forma, diante de toda a biodiversidade com potencial alimentício existente na Grande Florianópolis (SC), a pitanga foi selecionada para avaliação por ser uma fruta autóctone, mas ainda subutilizada e com baixa produção comercial no contexto catarinense.

Além disso, em levantamento preliminar (2017), verificou-se que os supermercados da região metropolitana de Florianópolis não comercializavam nem sua polpa e nem a fruta in natura, enquanto em casas especializadas em suco, a demanda pelo seu suco era ínfima, sobretudo se comparado ao suco de acerola (Malpighia emarginata Sessé & Moc. ex DC.).

Dentro desse contexto, o presente trabalho teve como objetivo analisar a comercialização, procedência da matéria-prima e demanda de produtos derivados de pitanga (E. uniflora L.) – polpa congelada, suco e sorvete – na Grande Florianópolis (SC). Após análise dos dados que contataram a baixa demanda do suco elaborado a partir de polpas industrializadas, o trabalho também objetivou realizar teste de aceitabilidade e intenção de compra, comparado o suco de pitanga formulado com polpa extraída artesanalmente da fruta com o suco elaborado com sua polpa industrializada, utilizando suco de acerola como padrão comparativo (por apresentar certa similaridade organoléptica, mas elevada demanda comercial). Espera-se que o incremento na demanda de pitanga auxilie na criação e valorização de cadeias de produção regionais da fruta, baseadas na agricultura familiar e no uso da biodiversidade local.


MATERIAIS E MÉTODOS


Análise da oferta, comercialização e demanda de produtos à base de pitanga


Dentre os produtos derivados de pitanga, selecionou-se para análise: polpa congelada da fruta, suco manipulado (ofertado por casa de sucos locais) e sorvete. O levantamento de dados ocorreu em agosto de 2017, restringindo-se à Região da Grande de Florianópolis (SC) – área de ocorrência natural da pitangueira (E. uniflora).


Polpas congeladas em redes de supermercados locais


A análise da presença e comercialização da polpa de pitanga nas principais redes de supermercados da Grande Florianópolis foi realizada por levantamento, através de contato telefônico. Foram avaliadas, ao todo, nove (9) das maiores redes de supermercados da região.


Suco


Foi realizado o levantamento do número de “casas de suco” localizadas no Centro de Florianópolis, através da ferramenta de busca “Google Search”4, sendo encontrados 13 estabelecimentos. Justifica-se a utilização dessa ferramenta de busca por ter sido a fonte com maior número de estabelecimentos descritos.

Todos os estabelecimentos levantados foram avaliados, sendo o número amostral equivalente ao censo para o Centro de Florianópolis. Aplicou-se nesses locais questionário semiestruturado, por meio de entrevista, objetivando analisar: presença do suco de pitanga, origem da fruta/polpa, sazonalidade de comercialização, além de demanda comparada com suco de acerola (Malpighia emarginata) – em virtude de semelhanças organolépticas, além dessa última ser uma fruta já consolidada comercialmente em sucos.


Sorvete


Foi realizado o levantamento de 28 sorveterias no município de Florianópolis, através da ferramenta “Google Search”. Das sorveterias levantadas, conseguiu-se contato efetivo (telefônico e/ou presencial) com apenas 18 delas, sendo esse o número amostral analisado.

Aplicou-se a esses estabelecimentos questionário semiestruturado, por meio de entrevista, objetivando analisar: presença/frequência de sorvete de pitanga, volume de comercialização comparativo (em relação a outros sabores


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4 www.google.com.br


comercializados), procedência da matéria-prima (fruta) e sazonalidade de comercialização.


Teste de aceitabilidade e intenção de compra de suco de pitanga


O teste de aceitabilidade foi conduzido, com base em DUTCOSKY (2007) e atrelado à questionário semiestruturado, com o objetivo de identificar preferências e defeitos entre o suco de pitanga formulado com polpa industrializada (presente no comércio local, mas com baixa demanda) e o suco elaborado a partir da polpa extraída das pitangas coletadas. Como referencial comparativo, analisou-se também a aceitabilidade do suco de acerola (formulado com polpa industrializada), utilizado como padrão de referência, por ser um suco com certa similaridade, presente no comércio local e com demanda consolidada.

Nessa análise, 75 julgadores não treinados (n= 75) descreveram e mensuraram propriedades dos sucos que são consideradas responsáveis pelo prazer de comer, importantes para o processo de desenvolvimento de produto. Além disso, foi analisada a intenção de compra dos sucos, bem como coletados dados sobre o consumo de pitanga, acerola e produtos derivados, por meio de questionário semiestruturado, aplicado conjuntamente ao teste.


Matérias primas: seleção, origem e armazenamento


Os frutos da pitangueira (figura 1A) foram coletados nos municípios de Florianópolis e Rio do Oeste (SC), no período entre setembro e outubro de 2017 – colhidas no ponto de maturação comercial. As pitangas foram higienizadas e então congeladas e armazenadas a -18° C até o momento do despolpe, no início de novembro de 2017.

A extração da polpa foi realizada no Laboratório de Produção do Campus Florianópolis-Continente do Instituto Federal de Santa Catarina (CTE/IFSC). As frutas foram descongeladas, sendo realizado o despolpe com o auxílio de uma centrífuga doméstica (Walita® – Modelo HI3242). Enfatiza-se que evitou-se triturar ou raspar as


sementes durante o processo, objetivando analisar esse aspecto como princípio de amargor das polpas industrializadas. A polpa foi congelada (figura 1D) em ultracongelador (Klimaquip® – Modelo UK 12b / 3.0) e armazenada a -18°C durante 3 dias. Observou-se no processo a Instrução Normativa Nº 01/2000 do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), que regulamenta os padrões de identidade e qualidade para polpas de frutas. Conforme a IN, a “polpa ou purê de pitanga é o produto não fermentado e não diluído, obtido da parte comestível da pitanga (Eugenia spp.), através de processo tecnológico adequado, com teor mínimo de sólidos totais” (p.11) e com certos padrões de qualidade, cor avermelhada, sabor ácido e aroma próprio (MAPA/BRASIL, 2000).

A polpa de pitanga industrializada (figura 1C) foi adquirida em casa de suco de Florianópolis. Selecionou-se para os testes a polpa da marca mais empregada nas casas de suco analisadas (55,6%), proveniente de empresa processadora do Paraná. A polpa industrializada de acerola também foi adquirida no comércio local, proveniente de empresa de São Paulo. As polpas foram armazenadas congeladas, a -18° C durante 4 dias.

Figura 1 – Pitanga (Eugenia uniflora L.) (A), seu processamento (B) e aspecto visual da polpa congelada industrializada de referência (C) e da polpa extraída artesanalmente da fruta (D).


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Fonte: Acervo dos autores.


Análise de rendimento de polpa a partir da fruta in natura


Para analisar o rendimento de polpa de pitanga, extraída com auxílio de centrífuga, dividiu-se o peso obtido de polpa pelo peso inicial da fruta inteira, representada na seguinte fórmula:

) x 100

Rendimento (%) = ( Peso da polpa extraída(g)  

Peso da fruta 𝑖𝑛 𝑛𝑎𝑡𝑢𝑟𝑎 (g)


Calculou-se o rendimento em porcentagem, com base na fórmula acima, com base em cinco repetições (n=5), ou seja, cinco porções de 500 g de fruta in natura (peso inicial). Calculou-se a média do rendimento das repetições, bem como o desvio padrão para análise estatística de dispersão dos dados.

Complementarmente, objetivando analisar o rendimento total possível das frutas coletadas, realizou-se mais um experimento, com base em três amostras de

100 g cada (n=3), com extração manual de toda a polpa (retirando apenas as sementes limpas), utilizando a mesma fórmula para o cálculo.


Elaboração dos sucos


Os sucos foram preparados conforme a Instrução Normativa N° 12/2003 do MAPA para “suco tropical adoçado” das frutas selecionadas (pitanga e acerola). Segundo essa IN (MAPA/BRASIL, 2003), o “suco tropical” de pitanga pode ser definido como uma "bebida não fermentada, obtida pela dissolução, em água potável, da polpa da pitanga (Eugenia spp.), por meio de processo tecnológico adequado" (p. 8). Além disso, esse suco deve apresentar cor variando de alaranjada a vermelha, sabor e aroma próprios, obedecer aos “Padrões de Identidade e Qualidade Gerais” fixados para “Suco Tropical” e as características apresentadas no quadro 1.

A diferença básica do suco tropical de acerola é que esse deve apresentar uma acidez mínima maior que no suco tropical de pitanga, bem como apresentar um teor estabelecido de ácido ascórbico (MAPA/BRASIL, 2003).

Dessa forma, os sucos foram elaborados com 35% de polpa de fruta, 7% de açúcar refinado e 58% de água mineral (% em peso), conforme padrão de referência estabelecido pela IN. Os sucos foram homogeneizados em liquidificador (Walita®,


Modelo BLSTMG-RD0-057) e condicionados em jarras de vidro identificadas com o número correspondente da amostra, sendo armazenados em refrigerador a 8° C até o momento do serviço.

Quadro 1 – Padrões de identidade e qualidade fixados para suco tropical de pitanga pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento.


PARÂMETRO

Não adoçado

Adoçado

Mín.

Máx.

Mín.

Máx.

Polpa de pitanga (g/100g)

60,00

-.-

35,00

-.-

Sólidos solúveis em ºBrix, a 20ºC

5,00

-.-

10,00

-.-

Acidez total expressa em ácido cítrico (g/100g)

0,50

-.-

0,30

-.-

Açúcares totais (g/100g)

-.-

8,60

7,00

-.-

Fonte: MAPA/BRASIL (2003).


Julgadores e aplicação do teste


O teste de aceitabilidade dos sucos tropicais de pitanga e acerola foi aplicado a um grupo de 75 julgadores não treinados, composto pela comunidade interna do Campus Florianópolis-Continente do IFSC, por convite aberto. Esse público avaliador foi composto de 65% integrantes do gênero feminino e 29% do gênero masculino, além de 6% que não responderam a esse critério. Em relação à idade, a maioria dos avaliadores apresentava entre 21 e 35 anos (41%), além de 33% com idades entre 36

e 50 anos, 13% com até 20 anos e 8% acima de 51 anos, sendo que 5% não responderam a esse critério.

Aplicou-se no teste questionário semiestruturado, objetivando analisar:



suco, assim como sua utilização ou consumo na forma de outros produtos derivados.

Na aplicação do teste, os sucos foram servidos em copos plásticos transparentes, contendo 70 ml de cada amostra como porção, identificados com três números aleatórios preestabelecidos: 325 (polpa de acerola industrializada); 491 (polpa de pitanga extraída da fruta in natura) e 674 (polpa de pitanga industrializada)

– ver figura 2A. A codificação das amostras por três números aleatórios foi realizada conforme recomendação descrita por DUTCOSKY (2007).

Para avaliação das amostras no teste de aceitabilidade, utilizou-se escala hedônica estruturada em cinco pontos (1 – desgostei muito; 2 – desgostei ligeiramente; 3 – indiferente; 4 – gostei ligeiramente; 5 –gostei muito), com base em Dutcosky (2007). Esse teste foi conduzido do no Restaurante II do CTE/IFSC.


Figura 2 – Amostras dos sucos de pitanga (491 e 674) e acerola (325) para análise sensorial (A); julgadores na avaliação das amostras (B).


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Fonte: Acervo dos autores.


Análises estatísticas


As médias das notas fornecidas para cada critério (cor, aroma, sabor e textura) foram comparadas entre os sucos através de análise de variância das médias (ANOVA), as quais foram comparadas pelo teste de Tukey (p < 0,05). O experimento foi conduzido com 75 julgadores não treinados (n=75).


RESULTADOS E DISCUSSÃO


Análise da presença, comercialização e demanda comparativa de produtos à base de pitanga


Polpas congeladas em redes de supermercados locais


Conforme pesquisa realizada nas nove principais redes de supermercados da Grande Florianópolis (SC), durante o mês de agosto de 2017, não foram constatadas comercialização de polpa de pitanga congelada em nenhum dos estabelecimentos. Esse resultado pode ter sido reflexo da baixa demanda pelo produto, de problemas relacionados ao seu fornecimento/distribuição, ou da comercialização padronizada de produtos de larga escala de produção.


Suco de pitanga em casas especializadas do Centro de Florianópolis


Conforme levantamento em casas especializadas de suco localizadas no Centro de Florianópolis (n=13), verificou-se que o suco de pitanga é comercializado em 69% desses estabelecimentos. Todos eles utilizavam polpa congelada industrializada, sendo que 56% afirmaram utilizar marca específica de empresa localizada no Paraná. As outras casas de suco utilizavam polpas de marcas variadas, todas provenientes de empresas de outros estados como São Paulo e Bahia.

Todos os estabelecimentos que comercializavam suco de pitanga afirmaram que sua demanda é muito baixa, sendo, comparativamente, dez vezes inferior à comercialização de suco de acerola (padrão de comparativo de referência). Dentre os motivos possíveis da rejeição do suco de pitanga, levantou-se preliminarmente: questões de hábito alimentar da população local; possível desconhecimento da fruta ou da opção da fruta na forma de suco, bem como características da polpa industrializada.

A análise de intenção de compra realizada no presente trabalho corrobora com essa constatação (ver figura 5), quando verificado que apenas 39% dos julgadores demonstraram interesse de compra do suco de pitanga elaborado com a polpa


industrializada, contrapondo-se aos 67% que comprariam o suco elaborado a partir da polpa extraída da fruta artesanalmente.

A demanda do suco pode estar sendo comprometida pelas características da polpa industrializada, não se descartando o fator adicional do desconhecimento da oferta. O suco de acerola, por sua vez, apesar de também elaborado com polpa industrializada, não apresentava o referido amargor como o de pitanga – conforme descrito por alguns julgadores, sendo que parte de sua demanda foi construída a partir divulgação em ampla escala de suas propriedades nutricionais, especialmente de sua concentração de vitamina C.


Sorvete de pitanga comercializado no município


Segundo levantamento efetuado em sorveterias do município de Florianópolis (n=18), 27,8% delas afirmaram comercializar sorvete de pitanga, sendo que a fabricação do sorvete em todas era realizada com frutas in natura, fornecidas por moradores da região. Apenas um estabelecimento mencionou utilizar polpa congelada, especialmente quando a fruta fresca não era encontrada.

Cerca de 60% dos estabelecimentos mencionaram produzir e comercializar sorvete de pitanga durante sua sazonalidade de frutificação na Grande Florianópolis (a partir de meados da primavera e verão), enquanto um estabelecimento afirmou adquirir a fruta durante o ano todo.

Em relação à produção do sorvete de pitanga, verificou-se uma média 7,5 vezes inferior a sabores tradicionais como morango. Entretanto, os estabelecimentos destacaram que há demanda para o sorvete, pois comercializam tudo o que produzem, mas que o volume de produção se restringe ao volume fornecido de fruta. Conforme entrevistas com os proprietários das sorveterias, duas afirmaram não utilizar a polpa industrializada em função de características dela, preferindo só produzir sorvete de pitanga quando conseguem as frutas in natura. Destaca-se que uma das proprietárias mencionou que o processo de despolpa e produção do sorvete deve ser feito rapidamente para não amargar o produto final, devido ao contato da


polpa com as sementes fragmentadas ou desgastadas no processo, além de possível oxidação.

Em suma, apesar de pequena porcentagem de sorveterias de Florianópolis oferecerem sorvete de pitanga, verificou-se que existe demanda na região, mas que fica restrita ao volume e sazonalidade de fornecimento da fruta. Além disso, infere-se que a qualidade das polpas congeladas de pitanga não favorece a fabricação de sorvetes, em função do amargor conferido. O uso da fruta in natura na fabricação desse produto em Florianópolis provavelmente é um dos motivos de sua demanda comprovada, o que não é verificado para sucos – que utilizam polpa industrializada.


Rendimento, hábitos de consumo, intenção de compra e aceitabilidade de suco de pitanga


Como já descrito, complementarmente ao teste de aceitabilidade e de intenção de compra dos sucos em questão, realizou-se análise do rendimento da polpa das frutas utilizadas no teste, bem como avaliado o conhecimento dos julgadores – constituídos por moradores da Grande Florianópolis – sobre as frutas selecionadas (pitanga e acerola) e seus hábitos de consumo.


Rendimento de polpa


O rendimento médio de polpa de pitanga com auxílio de centrífuga doméstica foi de 36,8±3,2%. Pode-se afirmar que esse valor foi muito reduzido quando comparado à literatura. Lopes (2005), por exemplo, encontrou rendimentos médios de 46,6±1,8% e 58,5±3,9%, através do despolpe por despolpador de pás e por despolpador de escovas, respectivamente. Contudo, o baixo rendimento obtido no presente trabalho, através da utilização de centrífuga doméstica, pode ser justificado pelo cuidado que se teve em não desgastar as sementes (mantendo-se pequena porção da polpa aderida) – um dos possíveis motivos de amargor levantado para a polpa industrializada. O foco estava na preservação da qualidade da polpa para os testes, e não no rendimento.


Por outro lado, através de experimento complementar, com extração manual (sem centrífuga ou despolpadeira) de toda a polpa de pitangas utilizadas, verificou-se um rendimento médio de 77±2%, representando um ótimo valor quando comparado com a literatura. Lopes (2005), em experimento utilizando o mesmo método, obteve o valor de 66,6%±2,6%. Já Bezerra e colaboradores (2004), que avaliaram 85 pitangueiras visando à recomendação de cultivares comerciais, relacionaram os dez melhores genótipos de pitangueira com rendimento médio de 78% de polpa. Com base nesse referencial, as pitangas utilizadas no experimento apresentavam ótima qualidade e genótipo para esse critério.

Como abordado, o rendimento pode variar conforme o processo de despolpe utilizado, bem como pelo cultivar de pitangueira – ainda com possíveis variações em função de condições de cultivo (solo, clima e manejo). Dessa forma, existem estudos de seleção de genótipos para obtenção de maior rendimento, bem como testes com diferentes despolpadeiras, visando à busca do mais produtivo e eficiente método de despolpe. Entretanto, verifica-se a necessidade de estudos de rendimentos a partir de métodos industriais de despolpe (bem como métodos inovadores) associados à análise das qualidades organolépticas das polpas extraídas.


Fruta, suco e derivados: conhecimentos e hábitos de consumo


Conforme questionário aplicado, 95% dos avaliadores (n=75) afirmaram conhecer a fruta pitanga. Em comparação, 91% mencionaram conhecer a fruta acerola.

Verifica-se uma redução desse percentual quando se analisa o consumo propriamente, e não apenas o conhecimento sobre a fruta – tanto para a acerola como para a pitanga. Conforme a figura 3A, 85% dos avaliadores afirmaram já terem consumido pitanga in natura, mesmo ela sendo dificilmente encontrada no comércio local, enquanto 71% afirmaram já terem consumido a fruta acerola fresca.


Figura 3 – Consumo de pitanga e acerola in natura (A), bem como do suco das referidas frutas (B) por moradores da Grande Florianópolis.


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*com base em 75 respondentes. Fonte: Elaborado pelos autores.


Nesse contexto, observa-se um maior consumo de pitanga in natura do que de acerola. Provavelmente isso se deve ao fato da pitanga ser nativa na região, encontrada não só em ecossistemas naturais conservados da localidade, mas ainda presente em quintais e pomares, ruas e parques da cidade. Por outro lado, a aceroleira

– originária da América Central e Norte da América do Sul (LORENZI et al., 2015) –

ainda não é tão comum assim, apesar do seu plantio ter aumentado nos últimos anos.

Entretanto, quando se analisa o consumo da fruta na forma de suco, a situação se inverte. Conforme a figura 3B, observa-se que o consumo de pitanga na forma de suco é menor: cerca de 51% dos avaliadores já experimentaram o suco da fruta, enquanto 85% já degustaram suco de acerola. Esse dado corrobora com o levantamento nas casas de suco de Florianópolis, onde a demanda por suco de acerola é consideravelmente superior, assim como com o levantamento nas redes de supermercados – onde a polpa de pitanga é ausente, mas a de acerola é frequentemente encontrada.

A partir desses dados, dois motivos foram apontados para justificar o reduzido consumo e comercialização do suco e da polpa de pitanga no atual mercado florianopolitano: o desconhecimento pela população local das possibilidades de uso da fruta que não seja apenas seu consumo in natura, bem como aspectos sensoriais das polpas industrializadas utilizadas nas casas se suco da região.

Por outro lado, no caso da acerola, há um maior percentual de pessoas que já consumiu o suco do que pessoas que consumiram a fruta fresca, tanto em função de uma menor tradição de seu cultivo nos quintais domésticos (apesar do incremento nos


últimos anos) e ausência de sua ocorrência em ambientes naturais da Grande Florianópolis, como pelo incremento da comercialização da polpa industrializada em função do marketing nutricional da fruta.

As mesmas constatações foram visualizadas na análise de frequência do consumo da fruta e do suco das frutas – figura 4A e 4B, respectivamente. Verifica-se que, nos últimos dois anos: 31% dos avaliadores consumiram entre 2 e 5 vezes a fruta fresca de pitanga, 21% consumiram apenas uma vez nesse período, enquanto 19% consumiram mais de 10 vezes. Já em relação à fruta acerola in natura, somente 8% dos avaliadores consumiram mais de 10 vezes a fruta in natura nos últimos dois anos, enquanto 23% consumiram uma vez e 21% consumiram entre 2 e 5 vezes.

Por outro lado, quando analisado o consumo na forma de suco (figura 4B), 60% dos avaliadores afirmaram não terem consumido suco de pitanga no último ano, enquanto 17% consumiram entre 2 e 5 vezes. Em relação ao suco de acerola, apenas 31% não consumiram nos últimos 12 meses, enquanto 35% afirmaram terem consumido o suco de 2 a 5 vezes no mesmo período.


Figura 4 – Frequência do consumo de pitanga e acerola in natura nos últimos dois anos (A) e frequência do consumo de suco de pitanga e acerola nos últimos doze meses (B), por moradores da Grande Florianópolis/SC.


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*com base em 75 respondentes. Fonte: Elaborado pelos autores.


Embora o consumo de suco de pitanga seja menor se comparado ao de acerola, 25% dos avaliadores afirmaram já ter consumido ou utilizado pitanga em outros produtos. Dentre esses: 53% consumiram a pitanga na forma de geleias; 32%


consumiram bebidas alcóolicas com a fruta; 26% consumiram pitanga em sorvetes ou picolés; 21% utilizaram cosméticos e 11% consumiram produtos panificáveis com a fruta. Por outro lado, somente 15% dos avaliadores afirmaram terem consumido ou utilizado algum produto à base de acerola além do suco, com uma baixa variação dos produtos descritos. Dentre essas pessoas, 36% afirmaram terem consumido a fruta em geleias e sorvetes, enquanto 27% consumiram a acerola em bebidas alcóolicas manipuladas com a fruta.

Conforme verificado e em função do aroma marcante e sabor característico da pitanga, percebe-se uma maior versatilidade de utilização dessa fruta em produções gastronômicas em relação à acerola, configurando-se em um grande potencial no setor. Por outro lado, a acerola parece restringir-se até o momento ao setor de bebidas, sendo empregada com frequência em sucos.


Teste de aceitabilidade


Conforme tabela 1, verificou-se que o suco de pitanga elaborado a partir das frutas coletadas (amostra 491) foi estatisticamente avaliado como superior em relação à cor e sabor quando comparado ao suco elaborado com polpa industrializada de pitanga (amostra 674). Essa constatação, associada à análise da intenção de compra (figura 5), evidencia que as polpas industrializadas estão sendo efetivamente motivo de rejeição do suco de pitanga em casas especializadas na Grande Florianópolis, apesar das notas estarem dentro dos limites de aceitação (superiores a 3, ou seja, superior ao conceito de “indiferente” – ver metodologia).

Quando comparado o suco de pitanga elaborado a partir da fruta (491) com o suco de acerola (325), observa-se que ambos foram avaliados como semelhantes em termos de textura, aroma e sabor, sendo que apenas em coloração o suco de acerola foi julgado como inferior (em função da coloração menos intensa, ou, como descrito pelos julgadores, “pálida”). Analisando conjuntamente os resultados de intenção de compra (figura 5), constata-se que esses dois sucos apresentam demanda semelhante, sendo que isso não ocorre de forma efetiva nas casas de suco do Centro de Florianópolis. A baixa demanda nas casas de suco deve estar relacionada às


características organolépticas das polpas industrializadas, que atualmente conferem ao suco certo amargor, provavelmente em função da incorporação da semente ou mesmo da oxidação de alguns componentes durante o despolpe.


Tabela 1 – Teste de aceitabilidade dos sucos tropicais com polpa de acerola industrializada (325), polpa de pitanga elaborada com a fruta (491) e polpa de pitanga industrializada (674), utilizando-se escala hedônica estruturada em 5 pontos, conforme Dutcosky (2007).


Amostra

Cor

Textura

Aroma

Sabor

325

3,70 ± 1,10

b*

4,10 ± 1,03 a

3,96 ± 1,06 a

4,19 ± 1,00 a

491

4,58 ± 0,71 a

4,30 ± 0,88 a

3,79 ± 1,35 a

3,93 ± 1,15 a

674

3,92 ± 1,23 b

4,15 ± 0,92 a

3,68 ± 1,07 a

3,25 ± 1,34 b

Valores são as médias ± o desvio padrão (DV), com base em 75 julgadores (n=75). As diferentes letras após os valores de cada coluna indicam diferenças significativas entre as médias de notas, de acordo com o Teste de Tukey (p < 0,05).


Com os resultados, verifica-se o grande potencial do emprego da pitanga no setor de alimentação, mesmo na forma de sucos (além de outros produtos), já que a demanda por suco de acerola é consideravelmente elevada e estatisticamente semelhante conforme os testes.

Evidencia-se que tanto a textura como o aroma não apresentaram diferenças estatísticas entres os três sucos avaliados. Julga-se que esses aspectos sejam mais difíceis de serem avaliados por julgadores não treinados – motivo das notas semelhantes. Desta forma, ao que parece, as diferenças da aceitabilidade desses sucos estão mais pautadas em diferenças de cor e sabor.

Em suma, os resultados apresentados mostram que todos os sucos foram aceitos pelos julgadores, em todos os aspectos, pois as médias das notas foram superiores a 3 (acima de “indiferente”). Entretanto, algumas pequenas variações parecem estar fazendo toda a diferença no comércio local, o que foi constatado na intenção de compra apresentada na figura 5.


Figura 5 – Intenção de compra das amostras dos sucos tropicais elaborados com: polpa de acerola industrializada (325); polpa de pitanga elaborada com a fruta (491); polpa de pitanga industrializada (674).


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*com base em 75 julgadores. Fonte: Elaborado pelos autores.


Conforme o teste realizado, constata-se uma intenção de compra muito semelhante do suco de acerola e do suco de pitanga elaborado a partir da fruta, com 70% e 67% de intencionalidade total (sozinho e em conjunto com outra amostra), respectivamente. Por outro lado, apenas 39% de todos os julgadores demonstraram intenção de compra no suco de pitanga elaborado com a polpa industrializada. Além disso, 9% dos avaliadores afirmaram terem desaprovado o sabor desse suco e outros 16% afirmaram sentir um sabor amargo.


CONCLUSÕES


O trabalho procurou evidenciar o potencial ainda pouco explorado da pitanga, fruta nativa brasileira presente no sul do país. Constatou-se na pesquisa que há aceitabilidade para o suco e demanda para o sorvete da fruta. Entretanto, certas características das polpas industrializadas parecem estar influenciando negativamente a demanda de produtos derivados, especialmente do suco. Sugere-se estudos em relação a métodos de despolpe de pitanga em termos industriais, levando


em consideração não só o rendimento, mas também a preservação das qualidades sensoriais da fruta.

Por possuir sabor e aroma característicos e marcantes, a pitanga apresenta uma grande versatilidade de utilização gastronômica, também pouco explorada, sendo que seu emprego pode favorecer tanto a inovação de produtos alimentícios, aprimorando cardápios de estabelecimentos do setor, bem como diversificando a mesa dos brasileiros em diferentes formas de preparo.

Por fim, destaca-se que o uso gastronômico dessa fruta pode contribuir de forma socioambiental na Região Sul, com o fomento de cadeias de produção locais, conservação da biodiversidade brasileira, além de possibilitar a construção de uma gastronomia mais identitária, com base em um produto autóctone diferenciado.


AGRADECIMENTOS


Agradecimento especial ao Campus Florianópolis-Continente do Instituto Federal de Santa Catarina, por fornecer todo o suporte possível para que essa pesquisa pudesse ser concretizada.


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