CARACTERIZAÇÃO FÍSICO-QUÍMICA DO ÓLEO BRUTO PROVENIENTE DOS RESÍDUOS DE SCOMBER JAPONICUS (CAVALINHA)


PHYSICAL-CHEMICAL CHARACTERIZATION OF CRUDE OIL FROM SCOMBER JAPONICUS WASTE


Ricardo Ramos da SILVA1 Edilene Ferreira da SILVA2

Rayane de Tasso Moreira RIBEIRO3 Victoria Maura Silva BERMUDEZ4 Vera Lúcia Viana do NASCIMENTO5



Recebido em: 05/06/2017 / Aceito em: 15/09/2017


Resumo


O setor pesqueiro consiste em uma atividade econômica de grande importância no Brasil e no mundo. O peixe faz parte da alimentação humana por apresentar um conteúdo considerável de proteínas e lipídios essenciais, dentre estes últimos os ácidos graxos poli-insaturados da série ômega 3 (ω-3). Scomber japonicus, conhecida como cavalinha, representa uma alternativa no mercado para a obtenção de óleos enriquecidos com ômega 3. Este estudo tem por objetivo avaliar as características físico-químicas do óleo bruto dos descartes de cavalinha in natura. As análises oleoquímicas realizadas foram: índices de acidez, ácidos graxos livres, iodo, peróxido e saponificação. Os resultados demonstraram que óleo bruto de cavalinha apresentou poucas alterações nas propriedades físico-químicas, em relação aos demais óleos de pescado e vegetais. O óleo produzido dos descartes da filetagem de cavalinha é rico em ácidos graxos poli-insaturados, portanto apresenta grande potencial comercial.

Palavras-chave: Descartes, filetagem, óleos marinhos, ômega.


Abstract


The fishing sector is an economic activity of great importance in Brazil and in the world. Fish is part of human food because it has a considerable content of essential proteins and lipids, among the latter the polyunsaturated fatty acids of the omega 3 series (ω-3). Scomber japonicus, known as “cavalinha”, represents an alternative in the market for obtaining oils enriched with omega 3.


1Graduando Instituto Federal do Piauí, José de Freitas, PI, Brasil.

2Doutoranda na Pós-Graduação em ciência de alimentos, Universidade Federal de Santa Catarina, Santa Catarina, Brasil.

3Programa de Pós-Graduação em Biodiversidade, Universidade Federal Rural de Pernambuco, Recife, PE, Brasil. E-mail: rayanetasso@gmail.com

4Doutoranda na Pós-Graduação em Ecologia e Recursos Naturais, Universidade Federal do Ceará, Brasil.

5Profª, Drª. Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Piauí. Teresina, PI, Brasil. E-mail: veravnascimento@gmail.com


This study aims to evaluate the physicochemical characteristics of crude oil from fresh horsetail discards. The oleochemical analyzes performed were: acidity indices, free fatty acids, iodine, peroxide and saponification. The results showed that crude cavalinha oil showed few changes in physicochemical properties, compared to other fish and vegetable oils. The oil produced from cavalinha filleting discards is rich in polyunsaturated fatty acids, therefore it has great commercial potential.

Keywords: Disposal, filleting, marine oils, omega.


INTRODUÇÃO


O peixe faz parte da dieta humana, não apenas como fonte de proteínas de alta qualidade nutricional, mas ainda como reserva significativa de ácidos graxos poli- insaturados (PUFAs) (Calder et al., 2009). Dentre os ácidos graxos, destacam-se os ácidos eicosapentaenoico (EPA-C20:5, ω-3) e docosaexaenoico (DHA-C22:6, ω-3), ambos da série ômega 3 (ω-3) (Cockbain et al., 2012; Li et al., 2013).

A espécie pelágica Scomber japonicus L., pertence à família Scombridae, conhecida popularmente como cavalinha, apresenta grande potencial para a comercialização no mercado pesqueiro (Feltes et al., 2010).

A cavalinha está entre os peixes marinhos mais representativos como fonte de óleos poli-insaturados, os quais se destacam pelo teor de ácidos graxos essenciais, como EPA e DHA (Cho et al., 2014).

Scomber japonicus, portanto, representa uma alternativa viável econômica e tecnologicamente para o aproveitamento dos resíduos de filetagem na produção de óleos enriquecidos com ácidos graxos poli-insaturados (MPA, 2013).

Outro fator que estimula o uso dos resíduos da filetagem do pescado é o ambiental com o objetivo de minimizar o acúmulo destes descartes no ambiente, protegendo os recursos naturais, buscando a sustentabilidade (Pires et al., 2014).

O presente trabalho teve como objetivo avaliar as características físico- químicas do óleo bruto da cavalinha in natura.


MATERIAIS E MÉTODOS


Amostras de Scomber japonicus foram utilizadas para a extração do óleo bruto (Figura 1). O pescado foi obtido em feiras livres das cidades de Fortaleza e Parnaíba, no período de abril a maio de 2016.


Figura 1. S. japonicus – peixes inteiros e descartes da filetagem.

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Fonte: Autores (2019)


O material foi transportado em caixas térmicas contendo gelo seco e levados ao Laboratório de Bromatologia do Instituto Federal do Piauí para extração do óleo e realização do pré-tratamento das amostras (em triplicata).

As análises oleoquímicas realizadas foram: índices de acidez (IA), ácidos graxos livres (AGL%), iodo (I), peróxido (IP) e saponificação (S), conforme metodologia da AOCS (2002).

Os descartes de filetagens (cabeça, nadadeiras, calda e vísceras) foram moídos em liquidificador industrial de baixa rotação. Após trituração, a amostra foi colocada dentro de um becker em banho-maria a 70°C por 2h. Em seguida, decantada por 24h sob 5°C. Após a separação das fases líquida e oleosa, adicionou-se sulfato de sódio anidro (Na2SO4 q.s.p.) na fase oleosa para reduzir umidade e turvação presente no óleo. Etapas descritas na Figura 2.


RESULTADOS E DISCUSSÃO


As análises físico-químicas do óleo bruto obtido dos resíduos de filetagem da cavalinha evidenciaram índice de acidez de 5,02 mg NaOH/g, considerado ligeiramente acima do limite determinado pelo CODEX (2011), que foi estabelecido


em ≤ 3 mg KOH/g de óleo concentrado de peixe contendo vísceras. FUADI, SUSENO & IBRAHIM (2014) encontram valores maiores (7,95 ± 0.61 mg KOH/g) para Scomber japonicus.

O percentual de AGL encontrado neste estudo foi de 3,54 ± 0,06, abaixo dos teores de óleo bruto de peixe marinho encontrado por NASCIMENTO et al. (2015).

Segundo ANVISA (1995), o percentual limite é de 5% de AGL, comparado com os óleos vegetais. Nesse aspecto o óleo de cavalinha encontra-se dentro dos padrões determinados, mesmo não tendo sido refinado.


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Descartes do Scomber japonicus

Trituração dos resíduos

Aquecimento do óleo bruto a 70°C por

Decantação por 24h a -5°C

Separação das fases (líquida e oleosa)

Desumidificação do óleo com Na2SO4

Armazenar sob refrigeração

Figura 2. Extração do óleo bruto de cavalinha (Scomber japonicus).


De acordo com a tabela 1, o índice de peróxido está acima do limite permitido para óleos de peixe, que é ≤ 5 mEq/Kg, segundo CODEX (2011). Com isso, verifica- se que o óleo sofreu alterações químicas oxidativas durante o processamento.

Com relação ao índice de saponificação de 161,85 ± 0,74 mg KOH/g, tal valor foi inferior ao encontrado por MORAIS (2001) com óleo bruto de pescado (186 ± 1,0). Conforme a ANVISA (1995), os valores encontrados neste lote estão abaixo do limite estabelecido para o bacalhau e cação de 192 e 195 mg KOH/g, respectivamente.

O índice de iodo foi de 150,55 ± 1,50 gI2/100g superior ao valor encontrado para óleo bruto de pescado por CUNHA (2009) de 133 ± 2 g I2/100g. Isto pode estar


relacionado ao grau de insaturação dos ácidos graxos, que varia nas espécies de pescado.


Tabela 1. Valores médios dos índices oleoquímicos

dos descartes de Scomber japonicus (cavalinha)     

Índices oleoquímicos Valores obtidos


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Índice de acidez (mgNaOH/g) 5,02 ± 0,09

% AGL (mg de ácido oleico/100 mg) 3,54 ± 0,06


Índice de iodo (g I2/100g) 150,55 ± 1,50

Índice de peróxido (meq.O2/kg) 8,74 ± 0,01

Saponificação (mgKOH/g) 161,85 ± 0,74

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*Valores de média ± desvio padrão (n = 3).

Fonte: Autores, 2019.


O pescado é, portanto, um produto susceptível à deterioração, devido a vários fatores relacionados à umidade elevada, concentração de nutrientes, ação das enzimas naturais, alto teor de lipídeos insaturados e pH próximo à neutralidade relatados por SOARES (2012).

ARAÚJO (2007), ao estudar a extração de óleo de peixe em temperaturas baixas e altas, percebeu que a acidez foi maior no óleo extraído pelo método a quente e comprometeu a qualidade da fração lipídica, similar ao encontrado por SHAHIDI (1998), que submeteu o óleo de peixe ao aquecimento.


CONCLUSÕES


O óleo bruto de cavalinha apresentou poucas alterações nas propriedades físico-químicas, com exceção do índice de peróxido.

Neste estudo, adicionamos dados sobre obtenção e características físico- químicas de óleos obtidos de descartes de peixes marinhos com importância econômica.


REFERÊNCIAS


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